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domingo, 28 de agosto de 2011

Noir

Noir

Na crônica da semana passada falamos do hard boiled, detetive durão insensível, e seus primeiros expoentes: Hammett e Chandler.
Ambientadas em meados do século passado, entre a grande depressão e os “anos dourados”, muitas histórias foram criadas. E tratam de uma América em crise, onde a construção da futura maior nação capitalista do mundo convivia com hordas de desempregados e aventureiros lutando pela vida.
Era uma América contaminada pelo desencanto, onde não havia ilusões entre os desvalidos nem complacência entre os vencedores: um mundo contraditório, cheio de reações ambíguas e homens violentos, os chamados “durões” — expressão imortalizada justamente por este gênero.
Nas histórias há sempre um detetive particular, maltratado pela vida e pelos tiras, que se envolve em casos geralmente estranhos, num mundo com sua lógica própria; são ricaços inescrupulosos, mulheres enigmáticas, prostitutas de luxo, escroques, assassinos de aluguel, tiras corruptos, enfim, gente da pior qualidade mesclada a perdedores de coração mole, tudo a 25 dólares por dia, mais despesas.
Foi a partir dessas histórias publicadas em livros, e também na revista Black Mask, que foi criada na França uma coleção para publicar estas mesmas histórias, todas com capa preta e impressas em papel vagabundo.
O termo pegou. Embora o gênero não tivesse sido inventado na França, a ideia de publicá-las em livros baratos com capas pretas — “noir” — nomeou o gênero. Apropriando-se dele, o cinema — utilizando a fórmula “crime, investigação e solução” e retratando personagens cínicos e durões insensíveis — fez um tremendo sucesso com seus filmes em branco e preto.
Como já disse anteriormente, não sou especialista em livros policiais, sou viciada na leitura deles! Penso o livro policial como o jazz da literatura: as músicas ou movimentos musicais estão sempre superando o que aconteceu antes, inventando e mesclando ritmos, mas o jazz é o Jazz.
Foram criados temas que vão evoluindo à medida que evoluem tecnicamente os instrumentos, mas a base, o tom do jazz, não muda. Enquanto outros movimentos se esgotam, ele continua: é uma grande arte.
O mesmo se diz do romance policial. Enquanto outras formas vão tendendo para o caótico, o romance policial se mantém com começo, meio e fim, e com a mesma fórmula: crime, investigação, solução… e sucesso absoluto de vendas.
noir, com a evolução de colocar o detetive nas ruas, usar e abusar do automóvel, com seus detetives durões e mulheres fatais, começando pelo Falcão Maltês, teve seguidores fantásticos.
James Cain (anos 1930/40), de O Destino Bate à Porta e A Mulher do Mágico, também foi dos inovadores. A maioria das suas tramas segue o mesmo esquema: um homem se apaixona por uma mulher, se envolve em uma atividade criminal com essa mulher e é traído por ela.
Ele desenvolveu o conceito de contar a história do ponto de vista do criminoso. Em o Destino Bate à Porta, um jovem errante deseja a esposa do velho dono de um boteco e, em consequência, os dois planejam o assassinato do marido. Foi um best-seller instantâneo, filmado logo depois. Cain diferia de seus antecessores por fazer de quase todos os seus personagens, senão todos, pessoas genuinamente desagradáveis e más, e revelar através das emoções delas como acabavam chegando ao assassinato.
Enquanto Hammett e Chandler escreviam sobre detetives bons/maus, delicados/durões, que tentavam desenredar a confusão causada por outra pessoa com um ato violento ou ganancioso, Cain criava personagens bidimensionais, interessados apenas em si mesmos, e motivados pelo desejo de dinheiro ou sexo. São personagens falhos, por serem demasiado e inteiramente maus, e o autor não demonstra piedade por eles.
Cain teve um biógrafo que o chamou de “o ovo de vinte minutos da ficção supercozida”, o Super Hard Boiled!
Ross Macdonald (anos 1960/70) criou o detetive Lew Archer, ex-policial de Long Beach, Califórnia, que foi demitido porque não tinha estômago para a administração corrupta da polícia à qual era forçado a servir, e por isso se tornou detetive particular (o mais famoso daquela época). Descrito como um homem solitário, que age com mais eficácia nas sombras, ele é também um “catalisador involuntário de problemas”. Trabalha num escritório pequeno e frio, mas surpreendentemente cheio de livros (que ele avidamente lê quando não está ocupado com um caso). As paredes têm pinturas modernas de boa qualidade.
Archer é diferente de muitos outros detetives durões, no sentido de que não se compraz com sexo promíscuo e tem uma verdadeira afinidade com pessoas jovens. Paul Newman o imortalizou.
Na próxima conto mais!

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